Compadecer-se de alguém, de algo, é sentir como Deus.
Devo reconhecer com sincera humildade, que meu coração não se iguala ao d'Ele. Essa é minha confissão, meu anseio.
Como operar com bondade e misericórdia sem ter o coração alinhado ao de Deus? Podemos ter uma aparência piedosa – um estado momentâneo e superficial, que outros podem considerar bom – e permitir que uma glória indevida recaia sobre nós, quando o único digno de recebê-la é o Cordeiro que foi morto (Apocalipse 5:12). Agir de forma precisa na necessidade alheia vai além de ser agradável ao próximo e a si mesmo. Sentir-se bem está distante da condição primária para uma ação benigna e eficaz. Isso porque a bondade é fruto do Espírito (Gálatas 5). Jesus sentencia no Evangelho de Mateus (19:17) que bom, só há um.
Muitos têm realizado obras de caridade. Alguns nomes estão escritos nos Anais da História, mas, tragicamente, fora do Livro da Vida. São grandes filantropos, pessoas "boas" como o Jovem Rico (Mateus 19:16-24), e até discípulos que negociaram o ministério por recompensas (Mateus 19:27), onde os primeiros serão os últimos. Nossas ações precisam ser fundamentadas no amor a Cristo. Reitero: a Jesus, o Senhor.
Ações institucionalizadas, ONGs, Fundações, cumprem um papel social. Elas tentam remediar, junto à sociedade, um déficit moral, os prejuízos acumulados ao longo do tempo por desgovernos, pela inoperância das políticas públicas e, para não nos isentarmos, por nossas vidas egocêntricas. Há muito a ser dito sobre isso...
Compaixão é coadunar-se com o coração de Deus-Pai.
Aquele que opera tanto o querer quanto o realizar é Deus (Filipenses 2:13). Todo ser humano precisa estar convicto, convencido de que o que se faz não é por força ou violência (Zacarias 4:6), nem por constrangimento (2 Coríntios 9:7) ou coação. Antes de querermos alcançar as pessoas, devemos ser alimentados em nossa alma, satisfeitos em Sua presença (Salmos 65:4).
“Os pobres sempre têm convosco” (Mateus 16:26), disse Jesus. A exortação foi feita a Judas (e a todos os discípulos presentes na casa de Simão, o leproso) ao importunar a mulher que quebrou o vaso de alabastro contendo um perfume valioso. Ela enfrentou a repulsa de todos ao derramar-se aos pés de Jesus. Vemos, então, que ter uma vida em adoração, onde nossa atividade não nos rouba da premissa de tê-Lo, é essencial. Ninguém nos demoverá de Sua íntima relação.
Fato: se a sensibilidade que devotamos às “causas humanas” é impulsionada pelo dinheiro, pelo fácil acesso aos poderes públicos, à isenção de impostos, à propaganda gratuita da empresa, aos investidores, empresários, artistas, devemos repensar nossa suposta compaixão. Digo, não precisamos prioritariamente de dinheiro; o recurso em falta é um coração quebrantado.
Alguém se preocupa? Está mais que perplexo com aquilo que nossas vistas alcançam?
Qual o seu talento, o seu dom? Sirva!! Antes de tudo, o chamado para amar é pessoal e intransferível. Abrace, sorria. Preocupe-se, ore e mova-se. Insista até que os pães sejam doados como em Lucas 11:5.
A Igreja, grata pelo sacrifício de Jesus, é alegre em poder servi-Lo, compreende a Graça da Salvação (Efésios 2:5) e, gratuitamente, agora é "Ponte de Livramento". Precisamos de mentes renovadas e interesses do Reino. Como disse meu amigo Edilson (servo de Deus na cidade de Alcântara-MA), “deixemos de ser uma igreja-parede a fim de sermos igreja em movimento”.
Compaixão é servir com alegria.
Analisemos a história de Maria do vaso de alabastro (Mateus 26:7). Ela ungiu Jesus com seu unguento precioso, e todos na casa de Simão, ao coro de Judas, ficaram aborrecidos com o desperdício, julgando melhor ter vendido e distribuído aos pobres. Jesus imediatamente a exaltou e repreendeu a todos. Ela o adorou.
Alguém quer se juntar ao Ministério de Compaixão de Judas? O sensível e aparentemente bondoso defensor dos frascos (vaso de alabastro) e dos oprimidos? Aquele injuriado com a irmã do azeite da unção, uma desperdiçadora de recursos financeiros? Quais os atributos de Judas? Ele coordena o fundo de amparo social do “bom Jesus”. Tem boa vontade. É estrategista. Anda com Jesus. Alguém se habilita?
Todo ato de compaixão deve ter a centralidade em Cristo (Mateus 7:21) e jamais na denominação religiosa. Estando n'Ele, podemos ser compassivos e misericordiosos. Antes disso, não!
Quantos Judas fazem “A OBRA DE JESUS” e não se parecem com Jesus?
A compaixão não se baseia em "know-how", no braço de carne, no "status quo". Vive-se a excelência e lança-se fora a negligência. Não se detém na bolsa de Iscariotes, no dinheiro que não entrou no caixa. Sabe-se do restrito fundo de missões e não se engana, não fantasia a realidade da obra, mas tem fé e perseverança.
Quem diz operar em compaixão não critica o momento que seu irmão está vivendo, mas o respeita; não se considera superior. “Ah, só vive prostrado adorando a Deus, não desce para ver o mundo...” Não, meu irmão, quem manifesta compaixão sabe que todos agem segundo o que recebem. Ou você é Judas? Em outras palavras, disse ele: não alcançaremos os pobres porque nos faltaram recursos.
Quem ele julgava? A mulher que resolveu “derramar óleo”? Orar? Interceder? Adorar a Jesus? Ninguém deve realizar algo com pesar ou deixar de amar por causa dos outros.
Não podemos nos perder em contendas do tipo: "Essa mulher diz ser adoradora e desperdiçou algo de valor, que absurdo!". É o mesmo que culpar uma parcela da igreja que canta e pula, dizendo que não evangeliza, ou que caça demônios e não se fundamenta em Cristo, ou ainda, que são fervorosos pentecostais ou tradicionais carnais. Não se pode rir disso.
A obra de compaixão não é responsabilidade de um grupo, mas de um chamado específico, pessoal e livre de condenarmos quem achamos não fazer. A compaixão é livre de amargura e ressentimento. É um atributo dos que vivem o Reino de Deus na Terra; então, rumemos na direção do Seu Espírito.
A compaixão flui de um coração adorador.
Quebranta-se com a miséria "alheia" à medida que Deus nos transfere Seu próprio sentimento.
A compaixão não se fabrica. Ela se vive. É natural. Faz parte de você.
Ouça a voz de Deus... Pessoas com quem estar, em quem investir tempo. Avalie o potencial que você tem em Cristo e posicione-se como um “agente do Verbo” (João 1) nos locais onde você se encontra, no bairro onde mora. Clamemos a Deus para nos conceder um peso de intercessão, de criatividade em como alcançar pessoas. Sejamos movidos por Ele (Atos 17:28).
Não é porque os outros fazem que eu também farei. “Vou abrir uma creche, vou fazer um orfanato, trabalhar nessa área, porque vi alguém fazendo e posso fazer melhor. Recebi uma profecia, uma verba e vou construir uma casa abrigo, etc.” Nos tornamos responsáveis e nos enchemos de convicção por aquilo que Deus fala; logo, fazer é proporcional ao que se alcança em Deus. Caso contrário, fabricaremos um monumento aos nossos feitos e não engrandeceremos a Deus, ou ainda, sucumbiremos face ao medo dos desafios.
A compaixão não deve ser um mero evento. Sim, é imprescindível a mobilização da sociedade, das instituições, diante das diversas aflições cotidianas. Contudo, antes de tudo, é vida que se doa nas oportunidades que Deus traz em horas inesperadas. Não há "grandes acontecimentos", não há vitrines para demonstrarmos nossos talentos, não fazemos pela foto ou vídeo. Será um encontro com uma senhora necessitada na rua, uma criança, um vizinho lutando com perdas familiares, um colega de trabalho solitário pensando em suicídio, um parente, adolescentes na sala de aula. Lugares e pessoas clamando por uma mão amiga, um gesto, uma nobre atitude. Ninguém saberá e não haverá placas de honra. Não haverá noticiário e talvez nem gratidão. Mas você estará lá... e Deus sabe. Portanto, a compaixão não busca reconhecimento, não busca mídia. Ainda vale: “que Ele cresça e eu diminua” (João 3:30). Se temos a glória dos homens (João 5:41-42), já está pago, não há galardão.
Podemos beneficiar a muitos, ganhar o mundo inteiro e ainda assim perder a nossa alma (Mateus 16:26).
A compaixão não se vende. Não usa os projetos sociais como plataforma eleitoral, nem abate as ovelhas como gado de corte, expondo a vergonha articulada por trás dos púlpitos.
A compaixão não se ilude com promessas não cumpridas.
Não é sustentada pelos “gentios”. Nossa missão é feita por provisão divina (3 João 1-4). Não deixará de ser feita por não haver verbas governamentais, do terceiro setor ou de "quinta categoria".
Somos todos os dias "Porta de Esperança" como na parábola do bom samaritano (Lucas 10:33). Aquele era o seu caminho, sua rota, e aquilo não o desviou de seu momento em Deus. Ele ajudou alguém. Não foi preciso que o Ministério da Misericórdia da Instituição fosse acionado. É disto que trata todo esse texto: vida exalando vida em nosso dia a dia. Quem faz “compaixão” somente com um grupo é religioso, faz uma “compaixão institucionalizada”, precisa de estrutura, de dinheiro, de “amigos”, de incentivos... A compaixão é vida cristã normal. Simples!
“Deem de comer vós mesmos” – Jesus ensinando os discípulos sobre a integralidade do homem e a necessidade de atentarmos não apenas para o espírito e/ou a alma, mas também para o estômago, para o corpo, para as questões sociais. Isso é verdade! Também é verdade que, ao alimentar a multidão, Ele também disse: “Em verdade, em verdade vos digo que me buscais, não porque vistes sinais, mas porque comestes do pão e vos saciastes” (João 6:26).
Devemos nos perguntar sobre o verdadeiro evangelho, as boas novas.
A compaixão gera vida e novidade de vida. Traz confronto pessoal. Não se deixa levar por ações sociais cujo enredo de transformação baseia-se tão somente em solidariedade e não está focado na salvação eterna. É primordial estarmos cônscios de que tudo o que fazemos deve levar as pessoas a conhecerem Jesus como Senhor e Salvador, sem, entretanto, de maneira alguma, barganhar o que se dá com uma confissão de lábios... “Eu te quero Jesus, à medida que me dão comida”... Isso é deplorável. Sejamos testemunhas da grandeza do Reino e Sua Justiça.
Deixe-me falar mais sobre isso. Jesus pregou o Reino de Deus e, vendo a multidão com fome (física), os alimentou. Sim, alimentou-os. Contudo, pregou e confrontou a cada um, inclusive os discípulos.
A compaixão que não apregoa o Reino, não traz luz às trevas, não destrói as cadeias de satanás, não manifesta o evangelho de poder para salvação é paparicar a sociedade caída sem Deus, é passar a mão nos pecados, é fortalecer uma leva de autocomiserados dependentes de nossas “cestas básicas” e entorpecidos com as bolsas da “fábrica dos governos”.
A manifestação da compaixão traz consigo: arrependei-vos, pois é chegado o Reino de Deus.
A compaixão traz mudança. A compaixão não é negócio que dá voto, dinheiro ou status. Definitivamente, não é mecanismo de crescimento ministerial. Não, amigo, não é joguete promocional do ministério quantitativo das sacolas divinas, da massa de manobra eleitoreira das bolsas de “Dá, Dá” à moda sanguessuga (Provérbios 30:15).
A compaixão é o exercício pessoal em não ser preconceituoso, restritivo, excludente, religioso. Deve-se ao próximo... amor! E o ato de compaixão dará espontaneamente seus frutos de salvação.
Que Deus tenha compaixão de nós e nos ensine a amar com intensidade. A Ele nossos corações.
Escrito por Charles Chai
* abril de 2011.
** Foto tirada povoado de Murici, Escola Timóteo 2010, na cidade de Alcântara.